Costumo dizer que a liberdade é minha eterna conselheira, assim como a morte é minha companheira. Por causa da liberdade, eu nunca soube decidir se meus pés devem virar raízes, pois uma das condições de ser livre é não ter amarras. E quem não as tem? Mas o que é liberdade?

Resposta difícil, nenhum filósofo conseguiu fechar este assunto. Apesar do relativismo dos conceitos de liberdade, creio haver uma medida do grau de liberdade. Se dividirmos o universo em mundos, tentando não ser tão cartesiano, sejam físicos, mentais ou espirituais, ou divisões não tão claras, como as usadas pelo cabalistas com suas sephiroth, bem como uma tentativa de não dividir nada como no taoísmo, mesmo assim poderemos perceber que somos livres em alguns aspectos ou manifestações da realidade. Um exemplo pode ser o de um sujeito condenado, que esteja preso, mas, que utiliza sua mente e é capaz de sonhar e escrever estes sonhos, seus pensamentos; capaz de criar novas realidades, ainda que mentais. Este personagem tem um grau de liberdade diferente de uma pessoa que sai todo dia para trabalhar às seis da manhã, pega seu transporte público, preocupada em não ser assaltada, se vai chegar em tempo ao trabalho, tem que correr ao final do dia para arrumar as roupas dos filhos e, quando muito, consegue ver uma novela que dita as regras da sociedade. Quem tem maior grau de liberdade? Resposta difícil.

Mas, acho que a pior restrição de liberdade é ter outro ser humano ditando as regras, dizendo o que podemos ou não fazer. Encaro as questões restritivas, como necessidade de comer, tomar água, respirar ou não ter asas para voar, apenas como condições de contorno, regras que não limitam a liberdade, apenas definem o ambiente; o tabuleiro e as regras do jogo. Entretanto, quando a restrição é devida a outro agente dotado de capacidade de estabelecer correlações ou qualquer entidade capaz de criar novas restrições, temos uma diminuição do grau de liberdade; alguém está trapaceando ou roubando no jogo. Esta é a situação que mais me incomoda, alguém tentando controlar meus atos, seja através de ordens diretas ou, como preferem os estúpidos e fracos, jogando informações provocativas para manipular sem nenhum escrúpulo.

E o que dizer da liberdade individual e da liberdade coletiva? A liberdade individual plena é atingida quando nenhuma outra entidade restringe as possíveis ações de um indivíduo. Mas, as regras sociais estabelecidas, aparentemente como condições de contorno, são, na realidade, restrições deliberadas, muitas vezes criadas por grupos de indivíduos com interesses específicos. Portanto, a liberdade coletiva é um imbróglio, não existe. Só irá existir uma liberdade coletiva quando todos os indivíduos, juntos, formarem um novo organismo, mais complexo, mas aí torna-se um outro indivíduo, um meta-indivíduo. Mas isto é outro assunto, com tabuleiros e regras diferentes. Outra coisa é a liberdade do indivíduo quando no grupo, na sociedade; esta liberdade só existe e é cada vez maior se o indivíduo não for limitado por restrições impostas pelos outros ou, ainda, não limitar sua própria dinâmica em função de terceiros, como o que acontece com as pessoas que vivem dos modismos e satisfações que acha que tem que dar ao grupo. Mesmo que outros indivíduos não estejam limitando ações, muitos indivíduos se auto-limitam por conta do que acreditam que os demais membros do grupo desejam ou esperam dele. Ainda temos que lembrar do ego, a força coercitiva da sociedade que mantem indivíduos unidos e restringe, sobremaneira, o grau de liberdade individual. Por isto, a liberdade só pode ser atingida, plenamente, na escala individual por indivíduos liberados das amarras do ego.

Então. Como entender a liberdade? Ora, podemos imaginar que o mundo, em suas diversas dimensões, conhecidas ou não, é formado por um conjunto de todas as possíveis soluções para a situação no tempo presente; ressaltando que estou considerando o tempo com uma restrição de não ser possível controlá-lo. Assim, a cada instante, infinitas soluções são descartadas e apenas uma é determinada, formando, para trás no tempo, uma linha histórica contínua de eventos relacionados pela causalidade e o futuro formado por um plano composto de todas as possíveis soluções, sendo o ponto de conexão entre a linha e o plano o momento presente. Semelhante à descrição do mundo quântico, quando temos que todas as soluções são estados reais, simultaneamente, até que se meça ou determine o estado, colapsando todas as soluções em uma única. É aí que vejo o conceito de liberdade, a capacidade de escolher qual das possíveis soluções existentes será determinada. Mas, a regra do jogo diz que deve ser respeitada a causalidade, ou seja, não pode existir solução que quebre esta restrição, por exemplo, se você decide queimar um papel escrito, jamais existirá uma solução futura na qual a informação escrita no papel esteja preservada. Outro exemplo, um sujeito chega para seu chefe, ofende-o barbaramente e pede demissão; neste momento, no plano de soluções, todas as possíveis soluções nas quais o sujeito trabalhava naquela empresa desaparecem do conjunto. Ou seja, pode-se fazer o que quiser, mas tem que arcar com as consequências dos atos. É isto que diz a causalidade.

Portanto, a grande liberdade é poder escolher em qual tabuleiro e conjunto de regras permanecer, ou seja, o maior grau de liberdade que podemos atingir é escolher em qual gaiola ficar e poder escolher as soluções em cada mundo-gaiola. Liberdade é poder voar de gaiola em gaiola.

One Response to “Liberdade da Gaiola”

  1. A liberdade não é dada é conquistada, Poder tê-la é ser sóbrio com sua lúcida loucura, agora aos demais que devido sua infâmia não poderás de ter e cabe aos sóbrios que de seu direito possuem a liberdade que a eles foram consagrada, fazer com que a liberdade não se torne uma prisão nas mãos daqueles que dela não podem possuir.

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