Um episódio hoje me deixou mais revoltado ainda. Andávamos, eu e minha companheira, pela praia de Guarapari – ES, quando ela disse que queria água de coco, mais até pra comer o coco do que pela própria água. Para minha surpresa, ao perguntar ao cara do quiosque por partir o coco para que pudesse o fruto ser devidamente devorado, ele respondeu que por ordem da prefeitura isto é proibido. Fiquei sem entender, inicialmente achei que era brincadeira do cara, mas, não, ele falava sério, e disse que a prefeitura publicou esta norma para evitar que se encontrasse pelas praias dois pedaços de coco em vez de apenas um, o que dá mais trabalho para a limpeza. Falou também que é para não ter facões disponíveis para evitar brigas.

Portanto, em Guarapari, não se pode comer coco porque tem gente que suja a praia e outros que brigam. Simples assim. Vivemos em uma sociedade completamente doente, onde as regras são feitas para todos, mas baseadas em poucos doentes. Assim, a sociedade toda começa a ficar contaminada pela doença de poucos, largando toda ela completamente doente, moribunda.

Mas, o mais importante deste episódio, foi que minha companheira comeu o coco, porque eu resolvi quebrar o coco no chão, mesmo ela já se dirigindo para o lixo para jogar fora o coco inteiro, o que eu, indignado, não permiti. Portanto, fica claro, nesta sociedade hipócrita, que somente podemos ter nossos direitos minimamente defendidos se quebrarmos o coco, ou melhor, as regras. Que a passividade diante de regras estúpidas nos conduzirá, apenas, à estagnação subserviente ao poder vigente e aos podres humanos que se encontram no exercício deste poder, não aquele poder de verdade, o poder que permite que coisas aconteçam, mas o poder do não-poder, aquele que um sujeito exerce para impedir que outro ou outros façam alguma coisa, aquele poder exercido para alimentar o ego de um imbecil, para ele sentir-se superior ao outro, o famoso porteiro de puteiro, o cara que tem o grande poder de impedir que alguém entre para se divertir, ele sente-se o todo-poderoso capaz de influenciar toda sua vida. O barnabé que te responde, depois de você se humilhar e mofar numa fila de repartição pública: verei o que posso fazer. Como se coubesse a ele o destino de toda a humanidade e, em especial, o destino de toda sua vida, inclusive após a morte. E existem pessoas assim em uma profusão inimaginável, até mesmo aquela pessoa que você acredita ser um humildezinho coitado, basta ter oportunidade para dizer, com voz grossa e encorpada: Não, você não pode fazer isto!

Existe um outro aspecto muito importante, o dinheiro! Tudo em nossa sociedade tem motivação financeira, não existe, absolutamente, almoço de graça. O que me faz pensar em outras motivações para a regra do coco inteiro, além da imbecilidade administrativa; alguém tem que lucrar com isto. Oras, em Guarapari, todos sabem que os cocos recolhidos diariamente pela limpeza pública são destinados à indústria automobilística para a forração dos estofamentos dos veículos, notadamente em uma fábrica no sul da Bahia. É bem provável que a indústria pague mais pelo coco inteiro, menos danificado, que exigiria menos tratamento para garantir a limpeza, já que um coco partido levaria mais areia para os automóveis. É, portanto, bem plausível que esta regra de não se poder cortar o coco seja porque alguém lucra muito mais com ela. E, como vivemos no Brasil, quem lucra muito e tem poder também compra leis.

Concluindo, como eu disse para minha companheira: se você quer comer coco, quebre as regras. Desobediência civil já.

2 Responses to “A Revolta pelo Coco”

  1. Rsrsrs lendo o texto e saboreando o delicioso coco, lembrei de uma das obras de Machado de Assis em que os habitante foram para o hospício rsrssrs . Se não lhe conhecesse diria que sua imaginação é fértil rsrsrs tamanha loucura dos loucos habitantes de Guarapari abaixarem as cabeças para esta doideira. Não sei se existe, mas deveria existir um site denominado Surreal, onde este texto seria aceito. É surreal tanto a lei como os habitantes rsrsrs. Acho que eles ao elaborar a lei erraram na grafia. Eles queriam expressar cocô, mas escreveu coco. Tudo doido rsrs

  2. Caro Mauro, e vc não acha que Machado de Assis era um profeta? Vivemos em um hospício a céu aberto, as leis são cada vez mais patológicas, são feitas já pensando na merda que os loucos habitantes farão…. temos exemplos de loucura delirante a partir de nossos governantes, basta ver um Temer discursando ou um Renan saudando os jornalistas após ignorar ordem judicial como se fosse um semideus. Este texto do coco tem um ano, e hoje, após este 2016, como vc diria, surreal, acho muito justo o povo não poder comer coco na praia…. deixa eu correr que o psiquiatra está me esperando ;)

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