Recentemente temos lido e visto notícias sobre a negação do holocausto de judeus durante a segunda guerra, quer por presidentes de países como Ahmadinejad, do Irã, quer por bispos católicos e ainda por cidadãos menos notórios.

O que me estranha é o fato de estas negações terem, pela mídia, valor de blasfêmia contra deus, pecado, além de ser crime em alguns países, como na Alemanha. Mas por que esta repercussão por opiniões discordantes da versão oficial? Deixo claro que não quero discutir se é verdade ou não que seis milhões de judeus (aproximadamente um terço da atual população de judeus no mundo) morreram em alguns anos de guerra, mas entender porque algumas opiniões não podem ser declaradas em um mundo supostamente democrático e com imprensa livre. Ou será que a imprensa não é tão livre assim?

Mesmo sem querer discutir a veracidade do holocausto, cabe comparar com outros episódios, também históricos, que não provocam estas reações quando são questionados. Vejamos alguns.

Angola, para citar um país com um relacionamento crescente com o Brasil e de mesma língua, saiu, há pouco tempo, de uma guerra civil de mais de trinta anos em que morreram mais de dois milhões de negros. Sendo eu branco, se eu disser que não acredito nisto, e que não morreram mais de, sei lá, duzentos mil, serei preso por negar o holocausto negro em Angola? Ou serei expulso de alguma agremiação, clube ou comunidade que faço parte? Acho que não.

Para ser mais provocativo. Eu, como os judeus, não acredito que Jesus tenha sido o messias ou mesmo que ele tenha tido a pretensão de montar uma igreja, mesmo eu tendo sido criado em família católica, sido batizado, crismado, comungado, etc. Ou seja, o processo pavloviano de fixação ou criação de realidade foi feito corretamente, mas acabei mudando de opinião ou de crença. Acredito, menos ainda, que sua mãe tenha concebido sem manter relações sexuais. Mas será que isto é motivo para eu ser preso ou esculhambado pela mídia? Ou os evangélicos deveriam ser fuzilados pela autoridade papal por não acreditarem em Maria?

O último exemplo pode ser considerado questão de fé, como de fato é qualquer coisa que consideramos verdade, pois apenas acreditamos. A menos que tenhamos presenciado um fato e tenhamos plena certeza de que não foi uma ilusão ou efeito cinematográfico hollywoodiano, à la Spielberg, qualquer coisa que tenhamos estudado nos livros de história pode não ser exatamente verdade. Ou seja, tudo é uma questão de fé. E pelo que me consta, a Declaração Universal dos Direito Humanos garante liberdade de crença ou fé.

Mas para não ficarmos apenas nestes dois comparativos, vamos citar mais alguns.

Hoje, todos nós achamos absurdo que Galileu Galilei quase tenha sido morto pela inquisição porque duvidava da versão oficial sobre a mecânica celeste. E ele defendia um modelo que já era defendido por Aristarco, na antiga Grécia.

Existem, também, diversas pessoas que duvidam que o homem tenha pisado na lua, que isto não passa de conspiração, usando já as técnicas hollywoodianas, mas não de Spielberg, pois os filmes são muito ruins. Mas será que Neil Armstrong tem o direito de mandar prender quem não acredita nele e nem no governo americano?

Eu poderia passar a noite escrevendo episódios que podem ser colocados em dúvida, mas ainda existiria outro argumento que poderia ser usado para demonstrar que o holocausto de judeus não pode ser esquecido ou questionado e, por isso, é dada tanta ênfase em sua confirmação ou transformação em verdade histórica: para que não ocorra novamente.

Não preciso defender uma tese de que este motivo não justifica absolutamente nada, que verdades históricas não impedem que erros sejam repetidos. Se fosse fato, não teríamos deputados safados reeleitos, isto para considerar a história recente e viva na cabeça das pessoas. O que pensar, então, de fatos que ninguém presenciou, como o assassinato em massa de índios em todas as Américas, dos mortos nas cruzadas e, ainda hoje, existem guerras santas; das duas bombas atômicas explodidas e hoje são milhares delas nos arsenais de diversos países. Erros históricos são ensinados nas escolas, passados de geração em geração, mas, mesmo assim, eles ocorrem novamente. Diria mais, o próprio holocausto não teria ocorrido, pois consta na Bíblia, que os próprios alemães diziam acreditar, que os judeus foram perseguidos na Babilônia, no Egito e já dá indícios da perseguição por Roma. A história nos ensina, ainda, que foram também perseguidos na inquisição em Portugal e Espanha. Ora, mesmo com todos estes fatos bastante massificados, verdadeiros ou não, não impediu que se repetisse na Alemanha. Será que vai se repetir, agora nos Estados Unidos, que tem uma população judaica de cinco milhões e oitocentos mil, maior que a de Israel? Se prosseguirmos, podemos imaginar que Obama será o novo faraó, imperador, papa ou führer.

O episódio mais recente foi a expulsão do bispo Richard Williamson, que nega o holocausto, da Argentina. Será que o erro histórico da santa inquisição será repetido? Será este bispo queimado na fogueira santa?

Minha questão continua em aberto. Será que podemos acreditar no que quisermos? Mas desde que na verdade de quem manda? Será que estamos condenados a viver na hipocrisia?

Sem discutirmos se houve ou não holocausto, seja de judeus, de negros ou índios, sérvios ou chechenos, o direito de acreditar é o mesmo para todos, seja acreditar na afirmação, seja na negação do que quer que seja. Repito, isto está escrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos, que recomendo que seja lida por todos antes de reinstalar a inquisição.

Alexandre Guimarães

20/02/2009

2 Responses to “Holocausto e Fé”

  1. Alexandre, bom dia!
    Realmente vc escreveu uma verdade, mas em um mundo de desigualdades tão profundas e necessidades reais, onde muitos vendem o almoço pelo jantar tudo é possível. Vivemos em um mundo hipócrita onde a fome garante o poder dos homens de coração empedernido. A igreja administra as mentes através da imposição do medo pelo pecado, enquanto ela própria está mergulhada no desrespeito através de tantos escândalos de pedofilia e muitos outros que poucas pessoas conhecem. No livro “O Papa Negro” podemos conhecer a face oculta e perigosa dessa empresa da fé, igualmente a outras que vendem o mesmo produto e loteiam o céu em suaves prestações. Enquanto o povo não deixar de ser imbecil e optar por uma fé raciocinada e abandonar uma vez por todas a fé cega, o mundo continuará ser o que é: fome, desrespeito e hipocrisia.

    Antônio Antunes Almeida

  2. Olá Antônio,

    É verdade, as empresas religiosas, que comercializam a salvação de uma alma cheia de pecados contraídos pelo consumo dos produtos de uma indústria cultural, que ensina a todos comprarem o que não precisam para fazerem o que não devem para depois pedirem perdão em uma igreja e lá deixar seu tostão.

    Mas, não vejo saída, afinal, é uma escolha que cada indivíduo faz, e ele deve ser responsável por estas escolhas. Eu gostaria muito de viver num mundo onde religião seja praticada no âmbito da individualidade, cada um que siga a sua e a pratique entre quatro paredes sem a pretensão de convencer ninguém da própria verdade. O direito à crença é um direito do indivíduo, deve ser exercido como tal; não é um direito coletivo nem uma regra de benefício social, como tentam impor os donos destas empresas religiosas.

    Deus é meu pastor, bebe meu leite, tira meu couro e come minha carne. Este e o deus vendido neste comércio. Quem comprou, que entregue o leite, o couro e a carne.

Leave a Reply

(required)

(required)

You may use these HTML tags and attributes: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <strike> <strong>

© 2015 Alexandre Guimarães Suffusion theme by Sayontan Sinha